quinta-feira, 31 de maio de 2007

Breve História da Guerra do Contestado - IV

A Guerra do Contestado (1913-1916) - Fase final


Banditismo no Contestado
Durante o rigoroso inverno de 1914, quando na região as
temperaturas alcançam 10 graus centígrados negativos e há ocorrências
de geadas e nevascas, os caboclos se organizaram, iniciando uma fase
de banditismo ao atacar as fazendas para roubar gado e grãos e para
arregimentar pessoal para reforçar os redutos. Na medida em que
se armavam e municiavam, intensificaram os ataques. Fortemente
guarnecida, a cidade catarinense de Canoinhas foi alvo de diversas
investidas de grupos comandados por Antonio Tavares Júnior e
Bonifácio Papudo, sem êxito, a maior delas em julho. Na área do
Paraná, piquetes de Henrique Wolland, o “Alemãozinho”, ocuparam
Papanduva de 27 de agosto a 3 de setembro. No dia seguinte, o ataque
foi dirigido a Itaiópolis. Quando a serraria da Lumber Company de
Três Barras foi ameaçada, seus diretores pediram proteção e, como
esta localidade era vizinha a Canoinhas, mas sob administração
paranaense, não foi mais possível ao Paraná deixar de se envolver
diretamente no conflito.
Atendendo aos apelos dos governantes dos dois Estados, o
Ministério da Guerra chamou o General Setembrino de Carvalho, que
estava atuando na pacificação dos rebeldes do Padre Cícero, como Interventor
no Ceará. Quando ele começou a organizar sua expedição,
ainda no Rio de Janeiro, os caboclos se lançaram à ofensiva, sob o comando
de Francisco Alonso e Venuto Baiano. No dia 5 de setembro a
serraria e os depósitos de madeira da Lumber Company, de Calmon,
foram incendiados, do ataque resultando em apenas um sobrevivente.
No dia seguinte, aconteceu o ataque ao povoado de São João. A composição
ferroviária, saída de Porto União da Vitória com um destacamento
militar sob o comando do Capitão Matos Costa para socorrer
Calmon, foi atacada e praticamente dizimada quando chegava a São
João, registrando-se a baixa do comandante. Os ataques alcançaram
todas as estações ferroviárias, fazendas e lugarejos ao Norte de Rio
Caçador. Assustada, a maioria da população de Porto União da Vitória
fugiu para Ponta Grossa. A investida contra o Capitão Matos Costa
foi condenada pelo Conselho de Comandantes que, em represália,
determinou a execução do mentor do assalto, Venuto Baiano.
P i q u e t e s sob o comando de Agostín Saraiva investiram contra
Curitibanos, onde incendiaram parte das casas, expulsaram
as autoridades e ocuparam a cidade por três dias. Dali, dirigiram-
se para os campos de Lages, levando o pânico à população campeira,
até que “Castelhano”foi morto por populares.
Outros piquetes saíam do Timbó em direção aos campos do
Corisco, investindo contra fazendeiros de Santa Cecília. No dia 2 de
novembro, o piquete de Chico Alonso atacou a colônia alemã de Rio
das Antas. Ali, Alonso foi assassinado por Adeodato Ramos, que
assumiu o comando do grupo e, a partir de então, revelou-se como
o mais temido chefe de redutos, superando o poder de Maria Rosa,
que foi destituída do comando geral.

Expedição Setembrino
Em Curitiba, o General Setembrino de Carvalho organizou
seu Quartel General, mobilizando boa parte do Exército Brasileiro.
Chamou seis regimentos de Infantaria, dez batalhões de caçadores,
três batalhões de infantaria, quatro regimentos de cavalaria, duas
companhias de metralhadoras, um grupo de artilharia de montanha,
um batalhão de engenharia, pelotões de trem, seções de ambulância
e hospitais de sangue. Diante da ascensão dos ataques dos sertanejos,
dispersos na vasta região, dividiu as forças em quatro colunas, a Norte
em Canoinhas, a Leste em Rio Negro, a Oeste em Porto União da
Vitória e Rio Caçador e a Sul em Curitibanos, para fazer um grande
cerco e, aos poucos, com o estreitamento das linhas armadas, apertar
e confinar os rebeldes a um só lugar. Depois de requisitar e receber
tropas de todas as Armas, inclusive a aviação civil do Rio de Janeiro,
ele se transferiu de Curitiba para a região em conflito no mês de
dezembro.
Na zona conturbada, em que o tráfego dos trens foi prejudicado,
os combates entre os caboclos e os militares eram diários. Aos
poucos, o cerco foi sendo apertado, com os sitiados começando
a sentir a falta de alimentos, armas, munições, roupas e remédios.
Sem mais condições para lutar, cente nas de famílias renderam-se
aos comandos das colunas. Na mata, a
ainda resistência ativa sobrevivia escapando de um reduto para outro.
A fome fez com que cavalos, cachorros, cintas, cangalhas, arreios,
bruacas e chapéus de couro cru se constituíssem em alimento. Uma
nova epidemia de tifo espalhou-se na região no início de 1915, alcançando
inclusive militares, como foi o caso do então Aspirante a
Oficial, Henrique Teixeira Lott.
O Exército só começou a ter êxito nas suas operações de guerra
após a contratação de centenas de civis, habitantes da região que não
haviam se envolvido com os rebeldes, conhecedores do terreno, que
foram colocados a soldo junto aos destacamentos para guiar e orientar
os soldados. Entre estes, chamados de “peludos”, destacaram-se
Fabrício Vieira, Carneirinho, Pedro Ruivo, João Alves de Oliveira,
João Göetten Sobrinho, Maximino Morais e Nicolau Fernandes.
Não foi possível o emprego a contento dos aeroplanos em bombardeios.
Depois de realizar vôos de observação, o avião pilotado pelo
Tenente Ricardo Kirk caiu no dia 1º de março, quando se dirigia de
Porto União da Vitória ao campo de aviação de Rio Caçador, onde
seria municiado com bombas para lançar sobre o reduto
de Santa Maria. O trágico acontecimento foi registrado no pioneirismo
da aviação militar brasileira.
Em fevereiro, sob o comando geral de Deodato, os caboclos se concentraram
no Vale de Santa Maria, no centro da área do Timbó, no coração da
Serra do Espigão, um local quase inexpugnável. Ali, resistiram aos
bombardeios dos canhões da Coluna Sul, até sucumbirem à valentia
de um destacamento da Coluna Norte, comandada
pelo Capitão Tertuliano Potyguara, que, depois de um bem sucedido “raid”
pelo Timbozinho em março, avançou pelos rios Timbó e Caçador Grande,
dizimando as guardas e redutos, entrando no vale pelo
Arroio Santa Maria na Semana da Páscoa.
A Carnificina desta expedição, encerrada dia 5 de abril, onde
morreram Maria Rosa e muitos comandantes caboclos, resultou
em mais de mil mortos e seis mil casas e casebres incendiados. Os
sobreviventes do etnocídio – ou genocídio – conseguiram fugir para
outro reduto, o de São Pedro.

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