quinta-feira, 31 de maio de 2007

Breve História da Guerra do Contestado - V

O FINAL DE UMA HISTÓRIA (conclusão)

Dissolvida a Expedição do General Setembrino em abril, nos
meses que se seguiram, até dezembro de 1915, as remanescentes
forças militares do Exército e da Polícia de Santa Catarina realizaram
a chamada “Operação Varredura”, destinada a caçar e eliminar
todos os sobreviventes caboclos que haviam liderado piquetes ou se
destacado nos combates. Ficaram famosos os fuzilamentos coletivos
ocorridos em Perdizinhas e em Butiá Verde, com os cadáveres sendo
queimados em meio a grimpas de pinheiros e sepultados entre cercas
de taipas de pedras. Com a prisão de Adeodato Ramos, em janeiro de
1916, sem mais liderança, pouco restou dos grupos rebeldes.
Ao final do conflito, levantaram-se oficialmente as baixas nos
efetivos legalistas militares e civis: de 800 a 1.000, entre mortos,
feridos e desertores. Por outro lado, estimaram-se as baixas na
população civil revoltada: de 5.000 a 8.000, entre mortos, feridos e
desaparecidos. O custo da Guerra do Contestado para a União foi de
cerca de Rs.3.000:000$000, mais os soldos militares.
Com a vitória, quem mais ganhou com o conflito foi o Exército
Brasileiro que, vindo de desgastes anteriores desde a Guerra do
Paraguai, Campanha de Canudos e participações desarticuladas,
desorganizadas e desastrosas nas intervenções em diversos Estados da
incipiente República, passou a se apresentar como uma organização
nacionalista, sólida e responsável, digno de respeito, assim abrindo
caminho para – conforme a pregação de Olavo Bilac – a instituição do
Serviço Militar no Brasil.
Cessados os combates na região, em agosto de 1916, no Rio de
Janeiro, os governadores do Paraná e de Santa Catarina assinaram um
“Acordo de Limites”, dividindo entre si o Território Contestado. Com
isso, após a homologação do documento pelos legislativos estaduais,
os catarinenses assumiram de fato a administração das terras ao Sul
dos rios Negro e Iguaçu, nos vales dos rios Timbó, Timbozinho, Paciência
e Canoinhas e a Oeste do Rio do Peixe.
Em 19 de janeiro de 1918, a União anistiou todos os envolvidos.
A Guerra do Contestado começaria a entrar para a História do
Brasil do Século XX.
O Estado de Santa Catarina encontrou muitas dificuldades
para desencadear seu plano de povoamento nas terras que lhe foram
anexadas por força do acordo, à vista da sobreposição de títulos sobre
as glebas demarcadas e destinadas à colonização. Como grande parte
dos imóveis haviam sido legitimados pelo Paraná, antes de 1916,
Parte do piquete civil de Pedro Ruivo, formado por caboclos catarinenses e
paranaenses, considerados “peludos”, a serviço do Exército, num momento de
desconcentração, antes de entrar em combate na região do Timbó.
tanto à Companhia EFSPRG como a fazendeiros e a especuladores
paranaenses, as questões foram levadas aos tribunais. O Governo Catarinense
perdeu todas as ações judiciais movidas contra a Cia. Estrada
de Ferro São Paulo Rio-Grande.
O Governo estadual escolheu como sistema de colonização
do Território Contestado a cessão de imensas glebas a particulares,
preferencialmente àqueles que compartilhavam o poder político e
se propunham à abertura de estradas, titulando-lhes, em parte, as
mesmas terras que o Paraná havia concedido à EFSPRG. As ligações
rodoviárias foram eleitas como de fundamental importância para a
integração catarinense. A década de 1920 marcaria o início da introdução
da modernidade, da efetiva ocupação e do desenvolvimento
do Planalto Catarinense, integrando o sertão à faixa litorânea. Entre
outros resultados, sobressaíram-se a indústria madeireira e o modelo
agrícola minifundiário e policultor, que gerou a agro-indústria.
Efetivamente, o desenvolvimento econômico na Região do Contestado
começou quando da chegada das primeiras levas de imigrantes
europeus, alemães, italianos, poloneses e ucranianos, e de descendentes
de imigrantes, na maioria ítalo-brasileiros e teuto-brasileiros, que
vieram tanto para explorar a floresta, em latifúndios, implantando a
indústria da madeira, como trabalhar na agricultura, em minifúndios.
As propriedades destinadas à colonização foram divididas em
colônias e, em pouco tempo, os núcleos coloniais transformaram-se
em povoados. No Setor Ocidental da Região do Contestado, ao longo
do Vale do Rio do Peixe, estes núcleos, mais os antigos arraiais,
prosperaram, com o que surgiram novas vilas, algumas delas que se
elevaram à categoria de cidades, como Caçador, Videira, Tangará, Capinzal,
Piratuba, num primeiro momento, e Rio das Antas, Pinheiro
Preto, Ibicaré, Treze Tílias, Lacerdópolis, Ouro e Ipira, logo em seguida.
Destes, mais tarde, nasceram Macieira, Salto Veloso, Arroio Trinta,
Luzerna, Iomerê e Jaborá. No Alto Uruguai despontou Concórdia,
do qual também originaram-se os municípios de Presidente Castelo
Branco, Lindóia do Sul, Ipumirim, Arabutã e Alto Bela Vista.
Em áreas pouco contempladas com projetos de colonização, nos
antigos Campos de Palmas-de-Baixo prosperaram as cidades de Água
Doce, Catanduvas, Irani e Ponte Serrada. Já Matos Costa surgiu nos
antigos Campos de São João, e Calmon nos Campos de São Roque.
Fraiburgo originar-se-ia na área do Campo da Dúvida, Taquaruçu e
Butiá Verde, enquanto que Lebon Régis, Santa Cecília e Timbó Grande
foram as primeiras cidades na Serra do Espigão. O Município de
Campos Novos logo cedeu terrenos também para a formação dos municípios
de Herval d’Oeste, Erval Velho e Monte Carlo. Em seguida,
para Brunópolis, Vargem, Abdon Batista, Zortea e Ibiam. Curitibanos
manteve a integridade territorial por muito anos, até que cedeu terras
para Correia Pinto e Ponte Alta, depois para São Cristóvão do Sul,
Ponte Alta da Norte e Frei Rogério.
Completando o desenvolvimento municipal na Região do Contestado,
temos que, no Planalto Norte, desmembrados de Porto União,
Canoinhas e Mafra, surgiram os municípios de Três Barras, Irineópolis,
Papanduva, Major Vieira, Monte Castelo e Bela Vista do Toldo.
Para a posteridade, o Homem do Contestado legou a Santa
Catarina uma herança cultural que inclui: uma lição de valentia e de
bravura, não se submetendo à tirania e à opressão, preferindo lutar e
morrer tentando ser livre; a consolidação do exemplar regime de minifúndios
policultores, provando a todos a possibilidade de, mesmo
pequeno, ser grande; o nobre sentimento de defesa de seu patrimônio
ambiental, desde quando o equilíbrio ecológico passou a ser ameaçado
pela devastação; finalmente, uma contribuição ímpar na descoberta
de caminhos para levar os catarinense a conquistar a sua cidadania
através da ação comunitária.

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